terça-feira, 30 de setembro de 2008

O Sinal e a realidade sindical atual


Portaria 186 fere unicidade sindical
Além da confusão criada com a proposta de extinção abrupta da contribuição sindical, que seria substituída pela chamada contribuição negocial, o governo Lula está se metendo em outra briga desnecessária com o sindicalismo. O Ministério do Trabalho baixou recentemente a portaria 186, que fixa as normas sobre registro sindical e alterações estatutárias das entidades. Afora a CUT, novamente a única a aplaudir o governo, todas as demais centrais questionam esta nova medida legal, afirmando que ela pode abrir caminho para a maior fragmentação do sindicalismo no país.Em agosto, onze confederações nacionais de trabalhadores já protocolaram no Supremo Tribunal Federal (STF) uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a portaria. Elas garantem que o projeto incentiva a multiplicação das federações e confederações, ferindo de morte o atual sistema confederativo, e que é inconstitucional. Elas também denunciam que foram excluídas do grupo ministerial que redigiu a medida. Criticado, Luis Antonio Medeiros, secretário de relações do trabalho e coordenador do grupo, retrucou: "Não extrapolamos nada. O que estamos fazendo é dar maior pluralidade ao sindicalismo", confessou o ex-presidente da Força Sindical.Onda de ataques ao sindicalismoA portaria 186 não preocupa apenas os dirigentes das confederações e federações. Ela também é alvo de críticas das centrais, com exceção da CUT, que sempre defendeu a implosão do sistema confederativo – para desencanto da Contag, filiada à entidade. Na própria Força Sindical, que tem livre acesso no Ministério do Trabalho, há fortes resistências. Todas as outras, CTB, NCST, UGT e CGTB, já condenaram a medida e exigem a sua revisão. Para Wagner Gomes, presidente da CTB, "a portaria 186 contribuiu para multiplicar o número de entidades sindicais, sobretudo as de segundo grau, e afronta a unicidade sindical consagrada na CLT e na Constituição".Na sua avaliação, está em curso uma onda de ataques ao sindicalismo, que visa enfraquecer as lutas dos trabalhadores. Após a histórica vitória do reconhecimento legal das centrais, o mesmo governo Lula baixou duas portarias perigosas – a 186 e a que extingue a contribuição sindical. Ao mesmo tempo, há um processo de judicialização das lutas sociais, com o ministério público adotando várias medidas para fragilizar as entidades sindicais, como a que fixa em apenas sete o número de dirigentes com estabilidade no emprego, a que exige autorização escrita do desconto da contribuição assistencial e a que nega a validade dos acordos coletivos entre as negociações. "Não dá para ficar de braços cruzados diante desta ofensiva", conclama Wagner Gomes.Um atentado à ConstituiçãoA portaria 186 também é rechaçada por juristas que sempre estiveram engajados nas lutas dos trabalhadores. Edésio Passos, ex-deputado federal do PT-PR e assessor técnico do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), foi um dos primeiros a listar suas "imperfeições". Para ele, vários dos 34 artigos da portaria cumprem o papel de aperfeiçoar o processo de registro e de alteração dos estatutos das entidades. Há, porém, "falhas, imperfeições e ilegalidades na portaria, que a comprometem parcialmente e indicam a necessidade de sua imediata revisão".Entre outros, ele cita o artigo 10º, que concede poderes excessivos ao Ministério do Trabalho no ato de impugnação do registro sindical, e o parágrafo único do artigo 2º, que trata das fusões de entidades. Para ele, porém, o mais grave é o tratamento dado às entidades de nível superior, com o estímulo aberto à fragmentação sindical. Na prática, afirma, o governo Lula, desde o primeiro mandato, vinha reconhecendo "a pluralidade no campo federativo e confederativo, embora esse campo sindical esteja definido há muitos anos no sistema da unicidade sindical". A nova portaria apenas legalizaria esta prática ilegal – "um fato saudado pela CUT". O renomado jurista não vacila em afirmar que o artigo é inconstitucional. "A ilegalidade contida na portaria é manifesta, uma vez que o sistema confederativo é reconhecido pela Constituição. O seu artigo 8º explicita: É vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau. Ou seja, em qualquer grau, significa também no grau superior das federações e confederações... Ao quebrar o princípio da unicidade, impedindo o livre curso da impugnação e aceitando o pluralismo no âmbito das entidades federativas e confederativas, a portaria 186/08 subverte o sistema e caminha em direção a sua desconstituição via estatal". É um fato grave!Interesses da CUT e da ForçaNo mesmo rumo, o histórico advogado José Carlos Arouca, desembargador aposentado do TRT e membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho, demonstra que os ataques à unicidade sindical são antigos. Na fase mais recente, a questão do registro gerou polêmicas nos governos José Sarney, Collor de Mello, Itamar Franco e FHC. Para ele, esta ofensiva ganhou maior ímpeto no governo Lula, "a ponto dele reconhecer confederações paralelas num sistema pluralista". Na sua avaliação, esta interferência indevida dos governos fere a "autonomia sindical" e desrespeita a própria Constituição, que determina a combinação da autonomia com a unicidade.Ele avalia que a portaria 186 é um dos piores golpes na unicidade na história do país. Sem papas na língua, ele arremata: "Salta a evidência que a portaria atende ao empenho da CUT e da Força Sindical em assumir a direção do sindicalismo. O propósito é seguir o modelo orgânico da CUT, a partir das centrais e não das bases, com ramificações para baixo e a criação de instâncias próprias desde sindicatos até federações. A portaria, obra isolada de um segmento do Poder Executivo, sobrepõe-se a lei, ferindo o artigo 516 da CLT, e ofende dolosamente a Constituição".

Um comentário:

XXII AND DO SINAL - Grupo 3 disse...

Procurador contesta lei que beneficiou as ‘centrais’
Folha
Em parecer enviado ao STF, o procurador-geral da República Antonio Fernando de Souza tachou de “inconstitucional” a lei que deu mais dinheiro às centrais sindicais.



Trata-se da lei que, a pretexto de regular o funcionamento das centrais, obrigou o governo a destinar a elas parte do imposto sindical pago pelos trabalhadores.



Aprovada pelo Congresso em março, a lei foi sancionada por Lula no início de abril. Em petição assinada por seu presidente, Rodrigo Maia, o DEM foi bater às portas do STF.



Abriu-se no Supremo um processo, que caiu na na mesa do ministro Joaquim Barbosa. Como manda a praxe, Joaquim requisitou a opinião do Ministério Público.



Daí o envio ao Supremo do texto que traz a chancela do procurador-geral da República. Um texto que, na essência, concorda com a alegação do DEM.



Para Antonio Fernando de Souza, uma alteração da “magnitude” da que foi imposta pela nova lei só poderia ter sido feita por meio de uma emenda à Constituição.



Se for seguida pelo STF, a manifestação do procurador-geral vai azedar uma sobremesa recém-servida às centrais sindicais: o acesso ao quindim do imposto sindical.



É uma mordida compulsória, da qual os trabalhadores não têm como fugir. Já vem subtraída do contra-cheque de quem tem carteira assinada.



Rende anualmente algo como R$ 1 bilhão. A nova lei empurrou cerca de R$ 100 milhões desse doce para dentro das arcas das centrais sindicais.



Antes, só os sindicatos, as federações e as confederações de trabalhadores tinham acesso à partilha.



A inclusão das centrais é, no dizer de Antonio Fernando, uma “afronta à estrutura vigente.” Constitui uma “intervenção estatal indevida em favor de entidades privadas.”

“Em resumo”, diz o procurador-geral, “a contribuição sindical compulsória é destinada ao custeio do sistema confederativo de representação sindical, no qual não se incluem as centrais sindicais...”



“...Ademais, não há respaldo constitucional para que certa associação seja contemplada com contribuições de caráter compulsório, uma vez que tal situação caracteriza, em última análise, filiação compulsória [do trabalhador], vedada pelo princípio da liberdade de associação.”



Munido do parecer do mandachuva do Ministério Público, o ministro Joaquim Barbosa vai agora redigir o voto que será submetido à deliberação do STF.



Não há, por ora, data prevista para o julgamento. De concreto, tem-se apenas o seguinte: subiu no telhado a lei que foi fesjada nos salões do Congresso com um coquetel patriconado pela Força Sindical do deputado Paulinho (PDT-SP).

Escrito por Josias de Souza às 19h17